Crédito: Observatório do Clima

Por g1 RR/Boa Vista

Roraima está em chamas. O fogo que se espalhou pelo estado está consumindo casas, animais e a vegetação. Segundo os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o cenário é o do pior incêndio já registrado no estado nos últimos 25 anos.

O estado tem pouco mais de 200 mil km² de extensão e é o menos populoso do país. No entanto, desde o início do ano mantém 30% de todos os focos de incêndio registrados no Brasil, de acordo com o Inpe. São 2,6 mil pontos de fogo.

Os incêndios são causados por duas razões principais:

  • A seca severa: neste ano, a temporada de chuvas veio menor do que o esperado, reflexo do fenômeno El Niño. Entre as dez cidades mais afetadas pelo fogo, cinco estão em emergência pela estiagem.
  • Queimadas: Segundo especialistas, nesta época do ano, é comum que produtores façam incêndios para a limpeza de áreas de plantio e pasto.

Com o solo e a vegetação seca, as temperaturas altas e a falta de chuva, os pequenos focos logo ficam incontroláveis e se somam às queimadas na região.

Para além de impactar na qualidade do ar, na segurança e na rotina de quem mora no estado, as chamas ainda atingem vegetação nativa da Amazônia — bioma que vem sofrendo com o desmatamento — e atingindo territórios indígenas. Entre as TIs atingidas está a Terra Indígena Yanomami, que passa por grave crise de saúde.

Os moradores estão vivendo em meio à fumaça. Em algumas regiões, a chama avançou sobre áreas onde há população residente e consumiu casas.

Na capital Boa Vista, desde a última semana, as noites têm sido marcadas pelas nuvens de fumaça geradas pela soma de incêndios urbanos, na zona rural, e de municípios vizinhos, como o Cantá e o Bonfim, o que deixa a qualidade do ar péssima.

Segundo o monitoramento do Inpe, instituto ligado ao governo federal, esse é o maior volume de incêndio já registrado em Roraima desde 1999, ano que em que iniciaram o serviço de identificação de focos de calor.

O ano de 2024 começou com os incêndios já acima da média. Até janeiro, eram 604 pontos com fogo em todo o estado. Em fevereiro, com o agravamento da seca e as altas temperaturas, o número mais que dobrou e desenhou um cenário de caos.

Até esta quarta-feira (28) o Inpe, que monitora a seca e as queimadas em todo o país, registrava 2 mil pontos de incêndio em Roraima no mês de fevereiro. Somando os dois primeiros meses do ano, o estado acumulou 2,6 mil pontos de fogo, o que é um recorde histórico.

Para se ter uma noção do impacto no estado, ficam em Roraima oito das dez cidades brasileiras com maior volume de pontos de fogo, segundo o Inpe. O estado divide o ranking com Mato Grosso do Sul e Mato Grosso. (veja os dados abaixo)

Por causa dos impactos do fogo, no início do mês, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima declarou estado de emergência ambiental em Roraima até abril de 2025.

El Niño e queimadas na zona rural

Roraima enfrenta o período seco desde outubro do ano passado e, segundo os meteorologistas, ele deve se estender até abril deste ano.

Segundo o histórico de dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) foram registrados 4,2 milímetros de chuva em todo o mês de janeiro inteiro. O índice representa 14% do esperado.

Em fevereiro, a chuva se manteve muito abaixo da média, com 21% do esperado. Choveu apenas 6,8 milímetros.

A falta de chuva colocou nove cidades em situação de emergência. São elas Amajari, Alto Alegre, Cantá, Caracaraí, Iracema, Mucajaí, Pacaraima, Normandia e Uiramutã.

Com a estiagem, na capital, Boa Vista, o Lago dos Americanos, que fica no Parque Anauá, ponto turístico da cidade, ficou completamente seco.

A estiagem é reflexo do El Niño, que aquece as águas do Oceano Pacífico e freia a atuação de frentes frias no Brasil.

O fenômeno se soma às queimadas na zona rural. Segundo especialistas, em fevereiro, quando os focos de incêndio mais que dobraram, é a época em que usam o fogo para limpeza de áreas na zona rural.

Um levantamento da organização não governamental Greenpeace aponta ligação entre os incêndios florestais em Roraima e queimadas controladas. A técnica é usada por produtores rurais para a limpeza do solo e há previsão legal para isso, sob autorização do governo estadual.

No período em que os focos se multiplicaram, segundo a organização, o estado de Roraima emitiu 55 licenças ambientais para queimadas.

Apesar do número levar em conta queimadas legais, o Greenpeace reforça que há ainda quem use o fogo de forma ilegal, sem a permissão ambiental. Portanto, o número de pontos de fogo causados pode ser ainda maior.

“As autorizações que foram dadas, em sua maioria, para queima de área de pasto, podem ter se alastrado para floresta. Além, é claro, da maioria desses focos de calor ocorrerem sem licença nenhuma, de forma ilegal”, explicou Rômulo Batista, porta-voz do Greenpeace Brasil.

“O fogo na Amazônia é muito utilizado basicamente para a renovação de pastagem, o problema é que esse fogo pode perder o controle e ir para áreas de floresta”, explica.
A Defesa Civil do estado admite que os pontos de incêndio cresceram com o período em que se iniciam as queimadas nas áreas agrícolas.

Procurado, o governo disse que revogou todas as autorizações. Informou também que atua com a operação Verão Seguro, que tem entre suas ações, as contratações de 230 brigadistas e a perfuração de 50 novos poços artesianos.

O município de Amajari é um dos mais afetados e tem “fogo para todo lado”, conforme Chaguinhas Soares, coordenadora da Defesa Civil da região.

“Mesmo tendo a brigada do Prevfogo, a questão é: fogo para todo lado”, resumiu Chaguinhas Soares, coordenadora local da Defesa Civil da região.
No município, alguns moradores contaram que viveram dias sem dormir para controlar os incêndios que nos últimos dias queimaram aos menos cinco casas, mataram animais e poluíram o ar com fumaça.

Na propriedade do produtor rural Francisco da Cruz, em Amajari, o fogo matou um bezerro recém-nascido e deixou outro ferido.

“A gente não dorme, nem de noite e nem de dia, tentando combater esse fogo. É uma coisa incontrolável . O que tem na frente ele vai levando, casa, animais, vai prejudicando tudo. A gente está nessa situação”, contou.

No último dia 22, a qualidade do ar no Amajari atingiu 44 µg/m3 em poluição causada por fumaça. Isso é três vezes o nível máximo de 15 µg/m3, recomendado pela Organização Mundial da Saúde.

“Três vezes mais do que o preconizado pela Organização Mundial de Saúde. Então, você imagina quanto o pessoal dessa região sofreu e continua sofrendo, porque o nível de poluição continua alto”, afirmou o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Reinaldo Imbrozio Barbosa, que há mais de três décadas estuda incêndios na Amazônia brasileira.

Na capital Boa Vista, o último dia 22 foi o mais crítico: o ar atingiu 82 µg/m3, cinco vezes o recomendável pela OMS. Na semana passada entre 19 e 23, os dias “foram péssimos para todo morador de Boa Vista”, disse o pesquisador. “Todo dia nós fomos fumantes passivos. Todos os dias, no dia 19, 20, 21, 22, 23”.


VEJA MAIS:

A reportagem de capa da edição 151 da Revista Emergência traz a discussão sobre o quão intenso e fatal é o fenômeno dos incêndios florestais, não só no Brasil, a exemplo do recente incêndio que atingiu as regiões de Viña del mar e Valparaíso, no Chile.
✔Segundo dados do INPE considerando os últimos dez anos, se percebe uma ascendência na curva de crescimento dos incêndios florestais no Brasil, em especial nos biomas Caatinga, Pantanal, Amazônia e Cerrado.
✔As mudanças climáticas, além das mudanças quanto ao uso e ocupação do solo estão entre as causas principais desse cenario.
✔Inúmeras ações surgem para enfrentar a situação, como a elaboração da primeira norma brasileira de incêndio florestal e a prática de manejo integrado do fogo.
👉🏼 Veja como órgãos públicos, privados e sociedade priorizam este assunto.

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