Afogamento – o tamanho do problema

“A Cura do incidente AFOGAMENTO é a PREVENÇÃO – Evitável em mais de 90%, o afogamento é chamado erroneamente de acidente, uma ocorrência por um acaso da natureza e, portanto, inevitável”. Szpilman, 2017

A tragédia do afogamento está presente em nosso dia-a-dia com 16 mortes diárias no Brasil (ano 2019). A realidade dos dados sobre afogamento aqui apresentados não destaca um novo problema, mas uma velha e grave endemia pouco conhecida e divulgada em nossa sociedade. Incidente silencioso, cercado de mistérios indecifráveis e muitas vezes atribuídas a uma fatalidade inevitável do destino ocorrem no ambiente extra-hospitalar em sua grande maioria, e por ter pouca ou nenhuma repercussão, não ganha à notoriedade e a atenção que necessita.

A Organização Mundial da Saúde estima que 0,7% de todas as mortes no mundo – ou mais de 372 mil mortes a cada ano – são devido a afogamento. Como alguns casos não são classificados como afogamento pela Classificação Internacional de Doenças este número subestima em muito a realidade mesmo em países de alta renda, e não inclui situações como inundações, acidentes de navegação e tsunamis.

Dentre todas as possibilidades de trauma, o afogamento é o de maior impacto familiar, social e econômico, tendo um risco de óbito 200 vezes maior quando comparado aos eventos de trânsito.1 O afogamento é uma das principais causas de morte em crianças e adultos jovens no mundo, embora estejamos quantificando apenas 6% do problema. Isto ocorre pela forma como os dados sobre o assunto são coletados, classificados e reportados, assim como pela dificuldade em interpretar e ajustar estes dados para nossa realidade.2

Para a sociedade em geral a palavra “afogamento” remete ao salvamento e as medidas de primeiros socorros como as mais importantes, no entanto a ferramenta de maior eficácia na luta contra os afogamentos é a prevenção. Então porque é tão difícil convencer nossa sociedade e gestores públicos e privados a investir neste segmento? As maiores razões para isto são o nosso desconhecimento do tamanho exato do problema, tais como o número de pessoas que diariamente se submetem ao risco de incidentes aquáticos e os custos humanos e financeiros destas tragédias (fatal ou não). Um dos grandes desafios neste segmento é conseguir impactar a sociedade com a possibilidade desta ocorrência que está entre todos e muito próxima de acontecer. O conhecimento destas variáveis nos permitirá elaborar estratégias que possam mitigar o fardo elevado do afogamento, utilizando melhor os recursos disponíveis em prevenção.2 Campanhas de prevenção além de poder informar e evitar o desastre de um afogamento impacta a sociedade com a possibilidade real desta ocorrência.

O afogamento envolve principalmente a assistência pré-hospitalar prestada por leigos, guarda-vidas, socorristas e profissionais de saúde. Portanto, é essencial que profissionais de saúde tenham conhecimento da cadeia de sobrevivência no afogamento que inclui desde a preparação, assistência pró-ativa de prevenção praticada em ambientes de saúde, a identificação de comportamentos e situações de risco iminente no ambiente aquático, passando pela assistência pré-hospitalar de atender uma ocorrência em seu ambiente familiar, até finalmente a internação hospitalar se necessária. No afogamento o resgate é um dos componentes vitais para salvar o paciente e a avaliação e os primeiros cuidados são fornecidos em um ambiente altamente hostil, a água. Aos profissionais de saúde, o conhecimento da assistência reativa prestada ao afogado para ajudá-lo sem, contudo, tornar-se uma segunda vítima é fundamental. Saber como e quando realizar o suporte básico de vida ainda dentro da água e acionar o suporte avançado pode fazer a diferença entre a vida e a morte do paciente. Quando este tipo de assistência não é realizado adequadamente no local do evento, pouco se pode realizar no hospital para modificar o resultado final.

DADOS SOBRE AFOGAMENTO

No mundo

  • Afogamento é a principal causa de morte entre meninos de 5 e 14 anos de idade.
  • Nos Estados Unidos é a segunda causa de morte por trauma em crianças de um a quatro anos de idade
  • Em muitos países da África e América Central, a incidência de afogamentos é 10 a 20 vezes maior do que em países desenvolvidos.  Na zona rural de Uganda, 27% de todas as mortes são por afogamento.
  • No Sul da Ásia o afogamento é a causa mais freqüente, dentre os traumas, de morte na infância, mesmo quando comparada ao acidente de transporte.
  • O afogamento tem como principais fatores de risco, o sexo masculino, a idade inferior a 14 anos, o uso de álcool, a baixa renda familiar, o baixo nível educacional, a área rural, a maior exposição ao meio aquático, e principalmente a falta de supervisão.
  • O custo do afogamento no litoral é estimado em 273 milhões dólares por ano nos Estados Unidos e 228 milhões dólares por ano no Brasil.

Para cada pessoa que morre de afogamento, quatro pessoas recebem atendimento no setor de emergência no EUA e 53% destas necessitam internação. Saiba mais!

No Brasil

AFOGAMENTO é 2ª causa óbito de 1 a 4 anos, 3ª causa de 5 a 14, e 4ª causa de 15 a 19 anos. Saiba mais!

  • A cada 90 min um Brasileiro morre afogado – 5.700 todos os anos.
  • Homens morrem 6 vezes mais e adolescentes têm o maior risco de morte.
  • O Norte do Brasil tem a maior mortalidade
  • 51% de todos os óbitos ocorrem até os 29 anos.
  • 75% dos óbitos ocorrem em rios e represas.
  • 51% das mortes na faixa de 1 a 9 anos de idade ocorrem em Piscinas e residências
  • Crianças < 9 anos se afogam mais em piscinas e em casa
  • Crianças > 10 anos e adultos se afogam mais em águas naturais (rios, represas e praias).
  • Crianças de 4 a 12 anos que sabem nadar se afogam mais pela sucção da bomba em piscina.
  • 44% de todos os afogamentos ocorrem entre Novembro e Fevereiro
  • Cada óbito por afogamento custa R$ 210.000,00 ao Brasil
  • Os incidentes não fatais chegam a mais de 100.000 casos ao ano.
  • Trauma raqui-medular (TRM) são menos comuns em praias oceânicas onde a água é mais clara (0.09% de todos os salvamentos realizados por guarda-vidas)2 e sua incidência é maior em rios, cachoeiras, lagos e locais onde a visibilidade da água não é boa ou muito transparente.
  • Estima-se que 94% da informação dos incidentes aquáticos em nosso país seja desconhecida por falta de notificação ou registro1 já que informações coletadas diretamente dos serviços de salvamento mostram que apenas 2% de todos os resgates realizados por guarda-vidas necessitam de cuidados médicos, e 0,5% sofreram ressuscitação.
  • Onde acontecem os afogamentos?
    • ÁGUAS NATURAIS – 90%
      • Água doce – 75%
      • 25% rios com correnteza (river stream)
      • 20% represa (dam)
      • 13% remanso de rio (backwater river)
      • 5% lagoas (lakes/ponds)
      • 5% inundações
      • 3% baía (bay)
      • 2% cachoeiras (waterfalls)
      • 2% córrego (stream)
      • Praias oceânicas (ocean beaches) – 15%
    • ÁGUAS NÃO NATURAIS 8.5%
      • 2.5% banheiros, caixas de água, baldes e similares
      • 2% galeria de águas fluviais (fluvial)
      • 2% piscinas (pools)
      • 2% poço (well)
    • DURANTE TRANSPORTE COM EMBARCAÇÕES – 1,5%

O blog Águas+Seguras trata dos temas ligados aos afogamentos. O responsável por este blog é David Szpilman, fundador, Ex-Presidente e atual Diretor Médico da Sociedade Brasileira de Salvamento Aquático – SOBRASA; Médico do município do Rio de Janeiro; Médico da reserva do Corpo de Bombeiros do Estado do Rio de Janeiro, Grupamento de Socorro de Emergência; Membro da Comissão de Prevenção e da comissão Médica da Federação Internacional de Salvamento Aquático – ILS; Membro da Câmara Técnica de Medicina Desportiva do CREMERJ e Fundador da “International Drowning Research Alliance” – IDRA.
[email protected] e www.szpilman.com