Técnicas de combate a incêndio interior (estrutural) – 1ª Parte

Nas aulas que ministro para as pós-graduações de engenharia de segurança, engenharia de incêndio e pânico e gestão de emergência e desastres, quando abordo tema especifico de técnicas de controle de incêndio interiores, debatemos muito sobre as questões que envolvem as estratégias e técnicas de combate direto e indireto, de forma a fornecer aos futuros especialistas o maior número possível de informações e subsídios técnicos visando propiciar a tomada de decisão mais assertiva quando de atendimento a um evento real.

Mas o tema ainda merece debates e estudos mais aprofundados, de forma a fornecer conhecimento técnico/cientifico mais detalhado sobre o assunto, face a sua relevância para as ações de resposta a incêndios interiores.

ABORDAGEM SOBRE AS TÉCNICAS E ESTRATÉGIAS DE COMBATE OFENSIVO E DEFENSIVO

Numa condição de combate o comandante da operação (CO) é quem definirá quais as melhores táticas, técnicas e estratégias que devem ser empregadas para o controle do incêndio, levando em consideração as condições e a fase em que o incêndio esta e quais recursos e meios estão disponíveis e presentes no local bem como se há presença ou não de vítimas que necessitem resgate.

Crédito: Rodrigo Ziebell/Ascom GVG

1 – ESTRATÉGIA OFENSIVA OU ATAQUE DIRETO

Essa estratégia consiste em atacar o foco do incêndio de forma direta, onde o respondedor empregará todos os meios e recursos disponíveis e adequados objetivando impedir seu desenvolvimento, tentando desta forma deixá-lo restrito à menor área possível. Em incêndios estruturais (urbanos), essa estratégia consiste na montagem e disponibilização das linhas de combate com mangueiras para ataque direto no interior da edificação.

Essa é uma estratégia muito eficaz, mas só deve ser empregada quando as condicionantes de segurança da edificação, intensidade e dimensão do incêndio de acesso interior assim permitirem. Por isso, sempre que possível e seguro, essa estratégia deve ser empregada, racionalizando os recursos humanos e materiais disponíveis, visando deslocar as chamas, a fumaça, os gases e vapores oriundos da combustão para fora do prédio, podendo ser combinadas as operações de combate (extinção) com as de ventilação tática (natural e/ou forçada).

Ataque direto: 

Podemos dizer que a técnica ou método direto consiste na aplicação de jato sólido ou compacto diretamente à base do fogo sobre a fase sólida do combustível como forma de resfriá-lo abaixo do seu ponto de fulgor, retirando desta forma o calor do tetraedro do fogo. É aplicável quando o foco de incêndio é visível e pode ser atingido de forma direta e com eficácia, pela aplicação da água.

Devemos sempre que possível evitar aplicar mais água que o necessário para a extinção. Este tipo de ataque pode ser executado de dentro ou de fora do local sinistrado, dependendo claro do grau de envolvimento. Se o fogo for localizado na fase inicial do incêndio, essa técnica de combate aplicada de dentro do ambiente extinguirá rapidamente o foco, já que age na base do fogo no material combustível incendiado. Mas se a estrutura estiver envolvida totalmente pelo fogo e a entrada não for possível, o ataque direto pelo exterior do prédio talvez seja a única técnica capaz de controlar o fogo com segurança.

Na fase inicial dos incêndios esta é a alternativa mais empregada e tem se mostrado muito eficiente.

A regulagem do esguicho deve ser efetuada de modo a que a água seja aplicada sobre os materiais em combustão de acordo com as circunstâncias do incêndio. O tipo de jato adotado, que pode ser compacto, neblinado ou atomizado, dependerá principalmente do material que está envolvido no incêndio; da área de extensão das chamas e da possibilidade de entrar ou não no ambiente sinistrado. Nas edificações onde o incêndio é mais extenso, o controle será mais efetivo se for utilizado várias linhas de ataque ao mesmo tempo.

Alertas e cuidados sobre a utilização da técnica

Deve-se evitar usar água em excesso de forma não calculada, a fim de não causar danos aos materiais do interior e reduzir a geração de vapores de água aquecidos, além de não provocar possíveis abalos térmicos.

Quando a intensidade do incêndio for menor, deve-se aplicar água na forma pulverizada, normalmente em neblina (jato de ataque e/ou cone de força), regulando-se a abertura do esguicho de forma a controlar a geração do cone de água (mais compacto ou mais neblina) sempre em função da distância de ataque, e da intensidade do calor, de forma que a água alcance o foco de incêndio, no estado líquido, atingindo os corpos em combustão.

Em locais com pouca ou nenhuma ventilação, deve-se utilizar jatos intermitentes e de curta duração, até a extinção do fogo. Os jatos não devem ser empregados por muito tempo, evitando alterar o movimento dos gases e o balanço térmico. Se o jato é aplicado por muito tempo, o vapor se condensará, precipitando desta forma a fumaça para o piso, gerando dificuldade de visibilidade, ou seja, os aerodispersóides (fumaça, gases e vapores) oriundos da combustão que estão ao nível do teto, irão se deslocar para o nível do solo (piso) ocupando o lugar do ar fresco.

O acesso a edificação envolta em chamas de alta intensidade só é justificável quando há presença de vítimas a serem resgatadas, pois o ideal é a utilização da técnica mais eficiente e que forneça maior segurança para as equipes de intervenção.

Devemos atentar que se houver pessoas no interior da edificação que necessitem de resgate, a estratégia ofensiva é a mais indicada, podendo seu emprego inclusive ser de caráter obrigatório.

Vantagens do ataque direto:

  • Pode ser aplicado jatos à distância relativamente segura;
  • É uma técnica que pode ser aplicada tanto em locais abertos quanto em compartimentos;
  • É uma técnica que fornece proteção contra a propagação do fogo à prédios vizinhos.

Desvantagens do ataque direto:

  • O ataque direto utilizado por muito tempo pode necessitar de muita água, a qual escoada do combustível, ou por não ter sido totalmente transformada em vapor, pode provocar alagamentos;
  • Se aplicada de forma não calculada e em excesso, pode afetar o balanço térmico tendo em vista a grande geração de vapor;
  • Pode deslocar fumaça e/ou gases para outros ambientes, gerando risco para vítimas presas pelo aumento da temperatura e possíveis intoxicações.

2 – ESTRATÉGIA DEFENSIVA OU ATAQUE INDIRETO

Por apresentar uma área de contato muito maior, a aplicação de água na forma de neblina é mais eficiente para a retirada de calor e para a geração de vapores que agem como abafador, retirando o comburente.

Ataque indireto

É o método que permite as equipes de intervenção realizarem a equalização térmica do ambiente, usando para isso a vaporização da água aplicada. A aplicação de agua deve ser realizada preferencialmente sem acesso ao ambiente, sobretudo quando o ambiente estiver confinado e com alta temperatura, com ou sem fogo.

Devemos prestar atenção pois esta pode ser uma condição ideal para a ocorrência de uma explosão ambiental (backdraft).

Esse método consiste na aplicação da água dirigida para as paredes e teto da edificação superaquecida, visando gerar a máxima vaporização da agua possível. Desta forma, podemos dizer que a extinção do incêndio se dará pelo efeito de abafamento (retirada / redução do comburente) originado pela grande geração de vapor de água produzida pela vaporização. Nesta técnica também não se deve usar água em excesso a fim de evitar o resfriamento excessivo das superfícies, já que isso poderá impedir a geração de vapores e água.

É importante atentar para também não ser gerado vapores em excesso.

Alertas e cuidados sobre a utilização da técnica

A sua aplicação típica ocorre quando o foco de incêndio é muito intenso, haja risco para as equipes de intervenção para acesso ao ambiente ou quando não seja possível atingir diretamente o foco do incêndio.

Essa técnica exige um melhor domínio dos padrões de jato e das manobras com esguichos especiais. Devemos atentar à grande geração de vapor de água produzida (cerca de 1750 L para cada litro de água vaporizado totalmente), por isso a importância da adequada ventilação tática.

O método de ataque indireto não deve ser aplicado quando existirem, ou haja suspeita da possível existência de pessoas nas imediações do foco de incêndio, pois pode a técnica tornar o ambiente de alto risco para elas, quer seja pela presença da fumaça e pelos gases de combustão serem arrefecidos e baixarem em direção ao pavimento, bem como pela geração de vapor de água aquecidos a altas temperaturas. A visibilidade no local também pode prejudicada pela combinação da fumaça e de vapor de água.

Da mesma forma, se não for possível garantir uma boa ventilação tática, o método de ataque indireto também não é recomendado. No ataque indireto, o esguicho será acionado por um período de 20s a 30s, no máximo. Reforçando que não deve ser utilizado excesso de água. E sempre que for utilizado o esguicho, esse deve ser aberto e fechado de forma lenta e progressiva, evitando desta forma possíveis golpes de aríete.

Vantagens do ataque indireto:

  • À água é direcionada as paredes e ao teto aquecidos, visando gerar grande quantidade de vapor quente e úmido que reduzirá as chamas e em alguns casos, extinguirá a base do fogo.

Desvantagens do ataque indireto:

  • A grande geração de vapor, pode oferecer riscos de queimaduras para as equipes de intervenção. O vapor gerado também pode sair sob pressão pelas aberturas e deslocar a fumaça para os demais compartimentos da edificação.
  • Como não visa atingir o foco do incêndio, objetos e materiais não atingidos pelo fogo podem ser danificados pela água utilizada neste tipo de ataque.
  • Se não existir garantia de uso de ventilação tática, o ataque indireto também não deveria ser usado, já que sem uma boa ventilação, se tornará difícil a extração da a fumaça e dos gases produzidos no incêndio e o vapor de água resultante extinção deixará o ambiente com baixa visibilidade e mais agressivo, dificultando a eficácia da extinção além de podendo colocar em risco a segurança dos respondedores.

3 – TÉCNICA DO ATAQUE COMBINADO E ESPECIAIS (3DWF e ZOTI)

São métodos de controle de incêndios em ambientes confinados, onde o ambiente se encontrará superaquecido, e será utilizada a geração de vapor de água, através do jato neblinado e variações como os jatos atomizados que também são formas de ataque indireto, auxiliado na extinção e/ou no resfriamento dos gases visando evitar ignições explosivas (backfrafts) e/ou ignições súbitas generalizada (flashovers).

Mas esse tema será abordado na próxima publicação.

REFERÊNCIAS

  • Manual Básico de Combate a Incêndio do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal
  • Manual de Fundamentos de Combate a Incêndio do Corpo de Bombeiros da PMESP.
  • Manual de Fundamentos de Combate a Incêndio do Corpo de Bombeiros de Goiás.
  • Manual da Luta contra o Fogo. IFSTA

O autor do blog é Marco Aurélio Nunes da Rocha, técnico em Segurança e em Petróleo e Gás. Graduado em Química e em Segurança, Licenciado em Biologia. Pós-Graduado em Gerenciamento de Crises, Emergências e Desastres, em Segurança e Higiene Ocupacional, em Toxicologia Geral e em Segurança contra Incêndio e Pânico. Especialista em Urgência e Emergência Pré-hospitalar. Professor de cursos de Pós-Graduação de Engenharia de Segurança, Medicina e Enfermagem do Trabalho, Engenharia de Prevenção e Combate a Incêndios, Defesa Civil, Gestão de Crises, Emergências e Desastres e APH Tático Militar e nos MBAs Executivos de Gerenciamento de Crises e de Safety e Security. Diretor do SINDITEST/RS.

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